segunda-feira, 26 de novembro de 2007

Minha mãe

Hoje é aniversário de minha mãe. Nem vou dizer quantos anos porque ela não aparenta mesmo a idade que tem, mas posso dizer que a mulher que sou hoje tem relação direta com essa mulher que me pariu.
Se eu tiver que pensar uma palavra que defina minha mãe eu penso em ENERGIA. Minha mãe é uma criatura viva e cheia de luz. Animadérrima. Quando eu tinha 15 anos era com ela que eu saía para as baladas, saindo pelos bares de Salvador atrás de uma boa música e ,várias vezes, eu pedia penico antes dela. Vá ter energia assim na casa do chapéu!
Guerreira.
Um mulherão grande, umas mãozonas, uns pezão! E braba, mas braba, daquelas de pegar um revólver e dar três tiros pro alto e fazer um prédio inteirinho calar a boca. Contei isso aqui. Uma vez, em uma dessas baladas, um amigo meu estava bêbado em um bar e, em um ataque de idiotice, encheu de forma muito séria o saco de nós todos. Estávamos vendo o dia raiar no Largo da Amaralina, as baianas de acarajé começando a armar seus tabuleiros, e nós no fim da balada. Esse amigo resolve jogar um copo de chopp na minha cabeça. Era amigo, eu gostava dele, mas isso foi além dos limites. Nos pegamos em um pau do cacete. Eu, descendo a lenha com meu karatê e ele devolvendo muito bem com seu taekendo. Uma saraivada de chutes altos, porrada forte mesmo. Minha mãe olhando. Quando o cara cansou - tava bêbado pra caramba - e caiu no chão, eu toda descabelada, com um monte de marca roxa pelo corpo, minha mãe diz: "Filha de peixe, peixinho é". Foi lá e deu um cascudo no moço e avisou pra não se meter com a filha dela. Até hoje ouço os gritos das baianas vendo o pau quebrando..." dá nele, menina!", " ensina esse bebum a ter vergonha na cara!", eparrei, Iansã!". E minha mãe indo embora comigo dando tchauzinho paras as baianas e murmurando: " Mesmo que esteja doendo, fica firme, não deixa parecer que se machucou. Segura a onda. Em casa você chora, mas agora você vai sair daqui firmona". Essa lição eu aprendi. To toda fudida, mas to firmona. Em casa eu choro, mas aqui eu não deixo a peteca cair.
Minha mãe é foda.
Batalhou pra caramba pra cuidar da gente depois que meu pai morreu subitamente. Hoje eu tenho noção exata do que é segurar uma casa, três filhos, correr atrás da carreira abandonada e ainda ganhar grana.
Minha mãe fez o que pode. Acertou e errou como qualquer ser humano, mas ele brigou com valentia e isso sempre foi motivo de muito orgulho para mim.
Quando eu estava na época de fazer o vestibular, eu queria medicina. Minha mãe me diz ( acho que só uma mãe como a minha me diria uma coisa dessas):
-Besteira, minha filha. Vai fazer teatro que sua coisa é palco!
Mas tinha lá suas chatices também. Nunca em minha vida namorei em casa. Ela implicava com todo e qualquer namorado que eu arranjasse. Nenhum era bom o suficiente para sua filhinha amada. Os baixinhos então. Minha mãe sempre desprezou os baixinhos. Não judiava deles, mas olhava lá de cima do seu salto imenso e fazia aquela expressão " putamerdavocêéumcocoemformadegente". Sabe como é? Se o namorado era alto, ele também era meio bobo. Ou sonso. Ou vesgo. Ou qualquer coisa. Quando ela falava que fulano era ótimo eu ficava até desconfiada. Se minha mãe gostava, não devia prestar.
Aos 19 anos fui morar só em um camping. Brigamos feio. Eu querendo crescer, mandar na minha vida, afinal já trabalhava de dia, já tocava à noite, tinha minha moto que eu pagava as prestações
( algumas eu não paguei e até hoje ouço frases sobre isso), fazia faculdade. Queria viver! Minha mãe tentando botar cabresto. Um pau da porra e a frase: " Enquanto comer da minha comida, me obedece".
Confesso que falei uma frase muito rude para minha mãe e se ela tivesse seguido o que mandei ela fazer, não sentava até hoje. " Amanhã me mudo daqui", disse eu. Só ouvi de resposta uma risada sarcástica. No outro dia eu me mudava para um camping e foi aí que começa a minha sina meio cigana. Morei três meses em uma barraca no meio do Parque Ecológico de Pituaçu, em Salvador. Eu dormia em uma barraquinha para dois lugares e tinha uma outra com todas as minhas coisas. Acordava com os macacos pulando na lona e pedindo banana, nadava ao raiar do dia na lagoa de Pituaçu, lavava minhas roupas no tanque comunitário e corria pelas ruas da cidade com minha moto, meu violão a tiracolo e foi assim que fiquei dona do meu arrebitado nariz.
Jurei que só voltava para lá como visita e é com muito orgulho que eu digo que cumpri a promessa. Me fodi de todas as cores, passei apertos que nem dá pra contar. Tive que aprender a resolver meus pepinos e segurar o rojão das decisões. Aos vinte anos eu era adulta, responsável e dona do meu nariz.
Depois desse pega pra capar entre mim e minha mãe, nossa relação mudou totalmente. Eu não era mais a filha mais velha que era bocuda, tinhosa e briguenta. Eu era uma mulher como ela. E eu consegui seu respeito no instante que saí de sua sombra e aprendi a crescer longe dela.
Porque ser filha de uma mulher como minha mãe não é coisa fácil não. Ter que ser muito macho pra ser mulher perto de uma grande mãe.
E eu sou o que sou porque tive uma mãe que me ensinou a não ter medo da vida, a ter fé, a ser positiva, a ter entusiasmo. Me ensinou que às vezes a gente pode tourear o problema, mas tem horas que a única solução e prender a saia na calcinha e descer o sarrafo em quem quer que seja, se não tiver jeito. Minha mãe me ensinou a não ter medo da morte, a não ter medo da vida, a não ter medo de cara feia, de macumba, de homem nenhum. Minha mãe me ensinou que a gente pode, quando precisa mesmo. Me ensinou que a alegria traz alegria. Que quem acredita que vai, vai mesmo. Me ensinou que não sou mulher pra ter ninguém me dizendo o que fazer ou como fazer, me ensinou a ser valente, a ser forte,a ter orgulho de ser mulher.
Mãe, tu é foda, véia, e eu sempre tive muita admiração por você.
Um beijo de aniversário!

5 comentários:

Anônimo disse...

Parabéns pra sua mãe....
Parabéns pra você!!

Fruto da árvore. Deve ser pessoa linda de se conhecer.

Anônimo disse...

Parabéns Mamãe da Tatiana!
Eita familia linda!

Tatiana disse...

A coroa é coisa rara!

Danny Reis disse...

Parabéns, parabéns, parabéns! :)

Anônimo disse...

Um beijo e muito axé prá essa véia porreta!