quarta-feira, 28 de outubro de 2009

Cansada.
Todo guerreiro cansa de vez em quando, não é?
Cansei.
Cansei de sentir, de fazer, de querer, de mexer, de segurar, de criar, de entender, de revirar. Cansei de estar tão atenta a mim. Cansei de estar tão atenta ao outro.
A perversa sabedoria me come os dedos dos pés e curiosamente eu tropeço.
Caí. Deitada no chão, o impulso natural seria querer levantar e seguir, mas o cansaço é tanto que o chão duro e cheio de pedra até me parece cama boa e quente em noite de inverno.
"Me deixe ficar aqui só mais um minutinho" - digo pra vida e ela, como mãe zelosa, me sacode os ombros, alisa meus cabelos, me empurra e me obriga a levantar.
Levanto choramingando e incapaz de argumentar com a vida.
Sim, tem que levantar, tem que seguir, tem que partir pra poder chegar.
Sei lá onde vou chegar. Abraço o mistério do caminho com o anseio natural de minha alma viajante.
Nossa, coitada de minha alma. Tão calejada, tão marcada, parece um jogo da velha. Toda noite quando vou dormir, coloco minha alma de molho em preparados emolientes pra ver se evito que ela endureça e trinque. Acordo, procuro pr ela, torço com cuidado, levo ao sol, estendo com carinho no varal do tempo, deixo quarar, deixo secar, deixo balançando ao vento. Minha alma é um lençol velho e amigo.
Meu corpo é um filho rebelde que me fala impropérios. Calo a boca dele com a moral que tenho. Meu corpo ri de minha moral. Meu corpo não sabe entender as sutilezas. Meu corpo é só instinto primitivo e eu preciso cansar ele, doutrinar ele, educar esses ímpetos. Deixo de castigo, ajoelho no milho, palmatórias, mando pensar, mando sentar quietinho em algum canto, brigo com ele, falo as lógicas mais óbvias e ele, idiota rebelde, se faz de surdo e obtuso.
Aí vem o coração. Coitado do meu coração. Tá tão velho, tá também tão cansado. Cacete pra todo lado, levanta o punho esquerdo, defende mas sempre entra um golpe desavisado, sai catando cavaco, sai rolando pela rua, sangra hemorragias internas profundas, sangra pra dentro, sangra calado, sangra seco como mandacaru morto. Meu coração geme e me pede um tempo. Não sou dona do tempo. Não sou dona nem de mim quanto mais do tempo. Mas eu te dou cafuné, meu coraçãozinho. Deixe de besteira, largue essa espada, coração não é pra viver armado, largue isso e essa raiva toda. Que besteira é essa? Fica assim não, meu bem, é só uma fase que já vai passar. Isso, chora aqui calado no meu colo. Vem cá que eu te faço uma massagem, te aliso as artérias, te afago as veias, faço um sambão com seu tum tum. Vem, vem cantar comigo. Isso, se levante quando eu canto. Isso! Saia de mim, escorra pelo meu corpo endemoniado, segure pela mão a alma, mas vem cantar comigo. É assim que eu aprendi a sobreviver: te dando o ar puro, te tirado do peito, te abrindo as portas, deixando que você voe, que você sangue em notas, mesmo quando te deixo cair no chão em baque surdo sei que o susto te faz bem. Levanta, meu amor. Levanta e continua porque eu to tão cansada, e sem você, coração meu, eu não quero continuar. Desiste não porque ainda não é hora de descansar. Vem comigo porque sozinha vai ser muito pior.

Um comentário:

Vibemix disse...

Querida, este post fala tudinho do meu momento. Estou nuns dias assim de pleno cansaço e brigando comigo mesma pra continuiar. Amei, como amotudo oque vc escreve..