quinta-feira, 29 de outubro de 2009

Uma minha muito querida ficou refém em uma casa de reablitação de jovens infratores. Essa amiga trabalha lá. Viu o pau comer, viu os meninos quebrando tudo, ficou com uma faca no pescoço, sentiu um medo do caramba, viu esses meninos levando cacetada, viu esses mesmos meninos muito doidos, cheios de raiva, ódio, medo.
No dia seguinte à confusão toda ela ainda estava mexida com isso tudo. Pensava se o sistema realmente funciona. Pensava naqueles meninos, acima de tudo.
Não, o sistema não funciona.
O trabalho dela é de arte-educação. Uma gota de luz na escuridão. Ela lá no meio de um monte de menino recluso, cada um com sua história, a maioria muito malaco, já na vida torta. Ela com um coração do tamanho do mundo, querendo mudar o mundo, querendo fazer alguma coisa.
E faz! Uma gotinha só, mas faz.
E sabe quanto ela recebe pra ficar ali, junto desses meninos, com risco de rebelião, de agressão, com responsabilidades imensas e atenção constante? Doze reais a hora-aula que depois tem todos os descontos legais. Doze reais para fazer um trabalho desse. E ver o que vê. E sente o que sente. E se frusta todo o dia. E questiona todo o dia. E tem as mãos amarradas.
Doze reais.
Não me conformo com isso.
Agora tá lá na casa dela, morta de preocupação com os meninos. O que acontecerá com eles. Se eles estão machucados. Se eles estão entendendo o que aconteceu com eles, se eles estão pensando na vida deles.
Depois de ser refém, ela tá lá ainda pensando neles.
Por doze reais a hora- aula.
E aindatem gente que acredita que o sistema funciona.

3 comentários:

Menininha bossa-nova disse...

Ainda bem que vc não foi...

Carô disse...

Essa história triste, triste, me lembrou um trecho de uma canção do Sérgio Sampaio que contava de dois garotos que eram amigos e brincavam de mocinho e de bandido, e que quando cresceram seguiram destinos opostos: "Depois que uma autoridade / Inventou-lhes um flagrante / Quanto mais escapa o tempo / Dos falsos educandários / Mais a dor é o documento / Que os agride e os separa / Já não são mais dois inocentes / Não se falam cara a cara / Quem pode escapar ileso / Do medo e do desatino? / Quem viu o pavio aceso do destino?"

Zénérso disse...

Sinceramente acho que ninguém acredita no sistema. O que muitos desejam é que esses meninos morram todos, antes que invadam suas casas. Antes que os roubem nos semáforos, antes que se tornem graúdos com armas na mão e nada... nada no coração!