sexta-feira, 23 de novembro de 2007

Campinas

Não nasci aqui.
Nunca desejei morar aqui.
Mas foi aqui que vim firmar meu barco. Aqui. Nesta terra sem mar e sem lembranças da infância.
Recusei Campinas por muitos anos. Não permitia que entrasse em meu coração porque minha terra, ali onde eu também não fui nascida mas que eu amo loucamente, ali na minha Bahia, em Salvador eu tinha firmado minha âncora e não queria abandonar aquele porto.
Campinas me tratou como uma mulher que ama e que não é amada. Uma mulher inteligente, é claro. Me deu tudo que eu pedia e me ofertava surpresas que me chocavam. Nunca invadia. Nunca queria ter um lugar que não fosse o seu. Sabia que brigar com a Bahia seria uma luta injusta e dada ao fracasso então simplesmente me ensinou a ver as suas belezas e seus encantos. E eu vi.
Esse céu de um azul brilhante em pleno inverno. O céu de Campinas é lindo! Fui envolvida por esse azul.
As ruas do Cambuí. Os paralelepípedos. As flores dos ipês cobrindo o chão.
A amplidão da Unicamp. A fartura do bandejão tão diferente da UFBa.
A movimentação frenética do centro, seus tons de cinza, seus barulhos e sotaques.
Os caminhos de Sousas e Joaquim Egídio que cruzei muitas vezes sozinha, pilotando minha moto e pensando o que eu faria da minha vida. As descidas pelo mato à procura de alguma cachoeira que eu pudesse molhar a cabeça. As trilhas de barro onde eu voltava coberta de poeira. As matas ao lado do Rio Atibaia. Longas horas sentada no meio do nada pensando na vida.
As noites. Foi aqui em Campinas que eu virei realmente profissional da música. Foi aqui que ouvi me chamarem de artista, de músico e não platéia. Levei um susto e pensei: agora eu sei o que eu sou.
As pessoas. Sempre ouvi que Campinas é terra de gente cuzona. Claro que tem gente besta aqui. Mas não tem em maior quantidade do que qualquer outra cidade. E eu não iria gostar de cuzão fosse ele carioca, paulista, gaucho ou baiano. Mas encontrei pessoas tão especiais aqui. Campineiros mesmo, não gente importada como eu. Encontrei poetas, boêmios, músicos, pensadores, famílias inteiras que me adotaram, gente de todo o tipo. Essas pessoas todas mudaram a minha forma de ver e ouvir a vida.
Campinas nunca me recusou nada que pedi e eu pedi muito.
Me deu meus dois filhos que foram gerados aqui.
Me deu uma carreira. Dois cd's adultos, um cd infantil e um dvd.
Me deu histórias que eu penso colocar em um livro.
Me deu grandes amores. Casei aqui. Separei aqui. Chorei e ri aqui.
Me deu um passado que me faz chegar em uma boate, no meio da madruga e o segurança imenso me olha e fala:
-Minha baiana! - aquele sorriso feliz de quem reencontra.
-Miúdinho! Vem aqui me dar um abraço!
E fico na ponta dos pés para abraçar um negão com mais de dois metros que foi segurança de vários bares onde trabalhei. Esse negão já deu em gente por minha causa. Já tirou marmanjo de cima de mim e já me perguntou se eu queria que ele sumisse com o cabra. Pra sempre.
Na boate só me empurra pra dentro sem exigir meus documentos e eu entro de forma vip me sentindo o máximo.
Um passado faz isso.
Meu passado tá aqui e meu presente também.
Como não dizer isso?
Amo essa terra tanto como amo a minha Bahia.
Talvez aqui não tenha o poder enlouquecedor de Salvador, a loucura de Sampa, a beleza do Rio. Mas a minha Campinas é linda. Com esse céu azul que me enlouquece, com o friozinho no inverno que me ensinou a apreciar um bom vinho e um chamego de baixo dos cobertores. Essa coisa cosmopolita. Essa torre de Babel dos sotaques. Campinas tem seus segredos e manhas.
Eu aprendi a desvendar esse mistério.
Amo tanto essa terra que digo que eu sou dela e ela é minha.
ô, minha Campinas, que nunca me deixou só.
Como agradecer isso tudo?
Não sei.
Se eu digo que a Bahia é minha mãe, posso dizer que Campinas é minha dinda, a madrinha do coração.
Um dia retribuo tudo isso para cá.
Um dia hei de agradecer tpo tudo que tive aqui.
Quem viver, verá!



12 comentários:

Anônimo disse...

É, Campinas é tudo de bom.....

Depois deste texto lindo, como são todos os seus outros, acho que fui respondido. Jamais sairá daqui.

Continuarei sabendo e ouvindo você, por gostar e vou fazer minha campanha em outro lugar, heheh quase uma letra, pode por melodia ehheh (brincadeira, claro!).

Te vejo em um próximo show e ai nos falamos.

Continuarei lendo você, adoro isto tudo!

Abraços

Anônimo disse...

ps.: tem Bocato em Sampa de novo. Estou de saida....

vem.....

Anônimo disse...

Fico feliz de saber de sua história e saiba que você é muito querida por aí e por aqui tb viu. Tenho uma história linda com Campinas também. Em qualquer lugar do mundo a gente consegue se virar, mas, a verdade é que Campinas nos vira de ponta cabeça quando a gente chega pra morar aí. Com as surpresas e a abundancia de oportunidades que se apresentam logo de cara. Essa cidade tem o dom de importar a gente, nem que a gente não queira. Ainda volto praí, que isso foi decidido por ela, a Campinas das surpresas em minha vida também.

Anônimo disse...

ah, a minha melhor surpresa até hoje aí foi encontrar vc e o ugo, numa noite terrível em que nada fazia sentido, putz como eu sou feliz por ter conhecido vocês. especialmente aquele dia, em que a gente acha que já esgotaram-se as possibilidades, que surpresa mais linda vocês tocando naquele bar, justo naquele dia. encheram meu coraçãozinho bobo de música pra eu seguir em frente e lembrar que nada mais importante que estar rodeada de queridos, de gente do bem, pra poder cantar alto de felicidade.
rs declaração né, querida! hahaha
parei de besteira vai, um grande beijo!

Tatiana disse...

Anônimo..
não costumo encontrar anonimos..hahahhahaha

Tatiana disse...

anna...
você é que foi nosso presente!

Vivien Morgato : disse...

Adorei essa declaração pra cidade, eu tb fui acolhida e tb amo esse lugar.;0)

Tatiana disse...

Vivien,
Campinas sabe receber, né?

Unknown disse...

Somos nós que fazemos a cidade. Ela é boa, se assim lhe parece. Por isso não falo mal de Campinas. A cidade que aprendi a descobrir é a mesma cidade que te acolheu. Quem não gosta de Campinas é porque ainda não fez amor com ela, não se propôs a descobrí-la, não entendeu porra nenhuma. Beijo.

Marcos Pontes disse...

O mesmo posso falar da tua Bahia que me recebeu e não rejeitou.

Tatiana disse...

Bruno,
É isso aí.
Não entendeu essa cidade.
E só de pensar nisso, já morro de suadades dela.

Tatiana disse...

Marcos.
É um belo de um presnete ser recebido de braços abertos, né?