terça-feira, 30 de janeiro de 2007

Pensando nesse telefonema, meditei.
O que faz um coração esquecer tão profundamente aquele abismo que penetrou?
Como pode se esquecer um amor?
Volto a dizer: amores verdadeiros não se esquecem.
E eu, na minha juventude de vinte e poucos anos, me enganava chamando de amor o que seria só uma quente paixão de olhos colados, peles arrepiadas e saudade arrebatadora.
Na inocência da minha inexperiência, eu catalogava em estantes erradas a minha história.
Hoje estou com um pano limpo limpando o pó que meus olhos mantêm. Tô rearrumando meu peito, para que eu possa dar lugar na minha prateleira do amor. Poeira sobe, eu engasgo, mas continuo firme e decidida.
Meu Deus, quão pouco eu amei de verdade!
Um imenso vazio se faz diante de mim, essa retumbante consciência de meu amadorismo em matéria de amor abre espaços nas estantes do meu peito.
Como livros há muito lidos, vou rebaixando os nomes, vou descendo volumes, vou abrindo velhas capas, lembrando gravuras que um dia achei tão vivas e perenes e hoje espalham seus amarelos, esfarelando em minhas mãos.
Me sinto vazia. Me sinto roubada. Me sinto uma biblioteca imensa que perdeu seus velhos livros. Eram de mentira. Não tinham o recheio das letras queos caracterivazam, eram capas douradas e duras que só faziam volume nas minhas prateleiras. Ninguém voltava ali para abri-los e viver porque dentro deles só tinham histórias mal escritas, enredos frouxos. E eu, a heroína fracassada e perdida, que sempre recomeçava com os mesmo velhos clichês.

Agora só vejo um livro abandonado. Tão solitário.
E exatamente por isso tão precioso.
Um livro que nunca mais será aberto, nunca mais manuseado.
Mas agora tenho mais espaço em mim para que venha um livro novo, uma outra história, um outro enredo.
Aguardo esse novo começo.
A hora chegou e eu estou pronta.

4 comentários:

Vivien Morgato : disse...

Sorte na sua caminhada.;0)

Ricardo Pereira disse...

com o tempo passamos a selecionar melhor os livros que levaremos para a cama de noite...

Tatiana disse...

Ricardo,
Não para a cama.
É para dentro do coração.
Só que o coração tem muitas prateleiras e eu acho que me perdi no meio delas.

Anônimo disse...

Que metáfora linda. Me dou conta que minha "estante" nem precisava ter mais de uma prateleira. E acho que com quase todo mundo é assim.