terça-feira, 2 de setembro de 2008

Poder pegar tudo que eu tenho dentro do peito e transformar em ouro bruto é a prova da minha alma de alquimista.
Transformo merda em adubo e desse adubo brota o meu melhor, minha nota mais limpa, meu olhar mais longínquo, meu passo mais longo, mesmo que cambaleante.
Alquimizo a vida.
Alquimizo a mim!
Pego o metal mais baixo, meu latão das emoções humanas, e jogo no caldeirão. Chia e chora no calor da minha intenção, mas mesmo assim dissolve e escorre.
Cobre derrete fácil como derretem as minhas raivas diante do tempo. Mancha de um vermelho velho e esse rubro é meu, de mais ninguém.
O peso do peito protegido por portas de chumbo some no instante que consigo tirar os parafusos, as porcas, as arruelas. Desmonto. Peça por peça cai aos meus pés. Retumba em meus ouvidos as trancas destruídas e eu tremo. Mesmo assim, juntam-se no Grande Caldeirão.
Meus pensamentos são cobertos por por uma fina camada de mercúrio líquido. Asas nos pés do meu pensamento. Voam. Voam e caem em gotas. Como lágrimas. Como chuva de lágrimas que no calor da alquimia evaporam.
Da minha boca saltam meus dentes de prata. Cada silêncio que ofereci. Cada pausa que dei e o preço que paguei por calar. Toda a prata mole que tem em mim, eu entrego. Minhas carnes macias, eu entrego. Meus gemidos mansos, eu entrego. Minha revelação sombria, eu entrego. Meu pedaço lua em quatro fases, eu entrego. Minha minguante dor, eu entrego. Minha crescente esperança, eu entrego. Minha cheia volúpia, eu entrego. Minha nova vida, eu entrego. Tudo é prata fria e mole. Minha taça de mim que eu entrego em reverente libertação.
Meus segredos de mulher são o pontencial do ouro.
Mexo tudo enquanto canto uma canção antiga como o Tempo.
Mexo tudo quando danço a mínima dança.
Outras mãos por sobre minhas mãos.
Outros mantos por sobre meu manto.
E eu, alquimia pura, transformo inverno em primavera.
Transformo o antigo em pepita preciosa.
Martelo da mão de Ogum, orixá guerreiro, bate um tum tum místico e forja o instrumento que agora carrego.
Iansã faz tremer com seus trovões e o temporal é somente um banho dos céus para me purificar.
Escorrem das mãos santas de Yemanjá as lágrimas de todas as mulheres do mundo e isso é o segredo não revelado.
Brilha agora em minha mão a peça de ouro virgem e é meu.
Meu olho no espelho olha além do espelho e por onde vou ilumino as sombras.
Meu ouro ilumina a mim e meu mundo.
Alquimia de mim.
Presente.

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