quinta-feira, 22 de outubro de 2009

Me sinto alisando minha barriga enquanto me olho no espelho, toda orgulhosa do que carrego dentro de mim. Tô gerando, to me preparando pra parir, to me duplicando, multifacetando, me estilhaçando também.
Tem alguma coisa em mim quebrando. Como a casca do ovo antes do nascimento, alguma coisa minha trinca. O som retumba dentro de minha cabeça e eu tremo. Tenho medo mesmo diante do milagre da criação. Medo de parir.
Minha cabeça não fica o tempo todo aqui. Nem ali. Ao mesmo tempo em todos os lugares que tenham uma cor que me ajude a juntar as partes disso tudo que trinca dentro de mim.
Povoada. Absolutamente povoada por idéias, canções, harmonias, melodias, batuques, ruídos, timbres que rasgam minha cara, mais idéias, idéias ruins, idéias geniais que esqueço.
Perturbada. Faz tempo. Tempo demais. Perturbada com as músicas que fiz e que não mostro. Perturbada pelas que fiz e nunca mais toquei. Pelas que eu nunca mais deixei que ninguém ouvisse. Músicas órfãs. Músicas abortadas. Músicas ruins. Músicas lindas que não existem mais.
Doida. Completamente doida. Pensando sobre coisas que a maioria das pessoas não pensam. São minhas coisas, meus sofrimentos de musicista, minhas angústias. Adoro minha loucura, preciso dela, mas ela me come por dentro e lambe os beiços.
Apaixonada. Demais. Apaixonada pela vida, pelo mundo, pelas pessoas que conheço e que irei conhecer. Apaixonada pelo minha profissão, pelo meu legado, pela música que ouço dentro de mim e de dentro dos outros.
Amo. Amo medrosamente mas amo sempre. Amo em montanha russa. Amo em trem fantasma.Amo em tom menor. Amo sustenido. Amo no contra. Na cabeça. Amo estupidamente. Amo rindo de mim, rindo do próprio amor. Mas amo e é isso que importa.
Transbordo. Transbordo de saudade das minhas canções melhores e mais perfeitas. Tanto me preenche que escorro toda, desmilinguo, desmorono. Transbordo de coisas que nem sei que tinha. Tanto afeto...tanto futuro...tanto de mim pra dar e eu sobro.
Sinto. Sinto o tempo todo. Sinto muito, sinto pouquinho, mas sempre sinto. Saudade, sinto também. Vontade, sinto sempre. Fé, já não sinto. Sou.
E canto. Canto tanto que me canso de me ouvir mas se eu fechar minha boca eu explodo, eu me acabo, eu viro alguma coisa que não sou eu. Canto mesmo quando estou calada, canto pensando no que canto, naquilo que vivi quando cantei pela primeira vez e repito, repito, repito, ouço o que fiz, maníaca, louca, doida, transbordada, carne viva que chora, eu, completamente insana, vidrada, repetitiva.
Assim que eu tô.
Mas não mudaria nada. Prefiro essa minha inquietude à vida sem criação. Prefiro morrer de angústia mas procurando alguma coisa do que morrer de tédio, absolutamente certa da escolha que fiz. Prefiro isso. Essa eterna procura. Um dia quem sabe eu acho.

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