terça-feira, 9 de janeiro de 2007

Na madrugada

A madrugada é morna e deserta.
Pelas ruas levemente iluminadas eu vejo teus olhos negros. Pequenos olhos. Lindos olhos.
Seus olhos em mim, sim, eu vi. Mesmo de tão longe eu vi.
A madrugada é confidente silenciosa. Nada diz de volta mas ouve meus sussurros abafados. Meus suspiros ela ouve e nada diz.
Mas o que dizer?
Nas madrugadas eu me revelo.
É no silêncio da madrugada que dou meu melhor grito, meu corpo nu de medos e véus, meus braços lisos de suor, meu sangue bebido nos lábios da louca madrugada e é ela que me bebe toda, me suga, lambe meus pensamentos tolos, me dá esquecimento e ternura.
É na madrugada que eu sou mais eu e ela sabe disso e acende as luzes do meu ventre, abre as cortinas dos meus olhos e docemente me faz dormir.
E quando a manhã se aproxima, como amante surpreendido, a minha madrugada amada vai embora deixando em mim uma saudade imensa, uma nota doída em tom menor que me acompanha, como mantra, por todos os meus dias.

2 comentários:

Ronaldo Faria disse...

Que as madrugadas possam despertar solenes e matinais, sem fugirem a cada raio de sol. Que elas se perpetuem como a gota do suor, lavando-se de prazeres e paixões.
Cuide-se.
Beijos.
Ronaldo Faria

Clélia Riquino disse...

Tati,

Seu texto remeteu-me a esta linda canção do Chico:

A noiva da cidade
Francis Hime & Chico Buarque/1975-1976

Para o filme "A noiva da cidade" de Alex Viany

"Tutu-Marambá não venha mais cá
Que a mãe da criança te manda matar
Tutu-Marambá não venha mais cá
Que a mãe da criança te manda matar"

Ai, como essa moça é descuidada
Com a janela escancarada
Quer dormir impunemente
Ou será que a moça lá no alto
Não escuta o sobressalto
Do coração da gente

Ai, quanto descuido o dessa moça
Que papai tá lá na roça
E mamãe foi passear
E todo marmanjo da cidade
Quer entrar
Nos versos da cantiga de ninar
Pra ser um Tutu-Marambá

Ai, como essa moça é distraída
Sabe lá se está vestida
Ou se dorme transparente
Ela sabe muito bem que quando adormece
Está roubando
O sono de outra gente

Ai, quanta maldade a dessa moça
E, que aqui ninguém nos ouça
Ela sabe enfeitiçar
Pois todo malandro da cidade
Quer entrar
Nos sonhos que ela gosta de sonhar
E ser um Tutu-Marambá

"Boi, boi, boi, boi da cara preta
Pega essa menina que tem medo de careta"

bjo,
Clé