domingo, 16 de abril de 2006

Nas vésperas de meus 39 anos, olho pra dentro e ainda sou eu que habita em mim. Incrível isso, essa minha capacidade de me agarrar em minha essência, como uma formiguinha grudada no pedaço de folha morta que a chuva tenta levar. Sou uma formiguinha na chuva e continuo agarrada esperando o céu abrir mais uma vez porque sempre o céu há de abrir e iluminar meus dias. E se a escuridão vem, como sempre vem, aproveito para fechar os olhos e descansar as retinas de tanta luz porque até luz demais cansa.

Meu filho amanhã faz dezessete anos.
Dezessetes anos escorridos de dentro de mim e eu nem me dei conta.
Uma incontinência de tempo me escorrendo pelas pernas, é isso que os filhos são. Um fluxo vivo da nova vida entrado no mundo, um ar fresco de orvalho molhado que me toca os olhos e eu gosto desta sensação.

Que tipo de homem ele se transformará? No futuro, meu colo ainda será suficiente para acalentar os problemas de um homem adulto? Será que terei a sabedoria suficiente para ser esteio de um homem maior que eu?
Não sei.
Filhos são entrega. São a minha entrega. Deixar que corressem o mundo quando eu queria que ficassem bem ali, debaixo da minha asa, dos meus olhos, sem correr riscos, sem correr sangue, sem sofrimento e sem riscos. Mas eu não seria uma boa mãe se forçasse isso. Disso eu sei com certeza.
O que não sei é se tudo que eu ensinei serviu para que meu filho, que vira homem cada dias mais rápido, aprendesse a ser feliz.
Ensinar a ser feliz só funciona pelo exemplo e eu até acho que sirvo como um bom exemplo. Nestes trinta e nove anos fiz muitas escolhas erradas, sofri com meus erros, mas sempre procurei achar uma solução para que a felicidade pudesse entrar em minha cozinha, abrir a geladeira, tirar os sapatos e se sentir em casa. Mas eu sempre escolhi a felicidade e o deleite. O prazer das coisas simples, do cheiro de café coado, o calorzinho do sol de outono nas costas, uma risada solta rolando pela sala. Mas eu sou assim. Um tendência absoluta para ser feliz e não sei se isso é genético. Isso é meu, mas preciso alimentar todo o dia.
Será que meu filho que faz seus dezessetes anos escolherá este mesmo caminho? Não sei. Realmente, não sei.
Então agora, nas vésperas de fazer aniversário, um dia antes de lembrar o dia que a vida arrancou ele de dentro de mim, eu só peço de presente que o destino me dê à felicidade de meus filhos. Peço sabendo que é um pedido absurdo porque cada um é responsável pelo seu próprio destino mas não quero perder a oportunidade de um anjo passando por mim, a orelha atenta e a boa vontade imensa.
Que todos os anjos do Senhor digam amém.
E relevem a ateísmo desse garoto porque eu fiz de um tudo para que ele acreditasse em alguma coisa, mas foi em vão. Aos sete anos abandonou Deus dentro do armário, no fundo de uma gaveta e a minha única ação é passar por lá de vez em quando, tirar o pó, dizer um oi, iluminar o canto escuro da divindade abandonada. Coitado do Deus de meu filho. Tão rápido banido daquela vida.
Tento compensar rezando por mim e por ele. Pedido de mãe deve ter alguma valia, penso eu. Então capricho nas palavras, abuso de minha retórica, nos floreios.
Espero que sirva de alguma coisa.
Enquanto não tenho certeza de nada, vou vivendo na minha vidinha de sempre. Mais um ano e acho que foi um ano bom. Uma boa batalha.
Valeu.

5 comentários:

Anônimo disse...

Como tenho dois filhos ateus, como eu. Logo, só posso dizer que Deus não é tudo. Ainda mais quando há centenas de deuses espalhados pelos cinco continentes, não apenas aquele que a religião católica criou. Um dia ele descobre o seu próprio Deus, com o nome e a seita que for E se não descobrir e ainda assim for feliz, valeu ser ateu... O importante é estar bem, consigo e com o mundo. Para quem consegue isso, Deus passa a ser um apêndice. E apêndice se extrai e se consegue viver sem ele... O importante é vê-los (nossos filhos) sorrir e aprender, sempre. Perto de nós ou não, com uma "entidade superior" junto ou não.
Cuidemo-nos...
Ronaldo Faria

Anônimo disse...

Nossa...fico cada dia mais passada com esses seus textos Tatiana!
Esse em especial me deixou encantada!
Lindo!
Que os anjos realmente digam Amém pra toda a felicidade que vc deseja ao seu filho!E, por mais ateu que possa ele ser, vai encontrar algo em que acreditar, hora ou outra isso acontece.
Um beijo grande
Tenha uma linda semana!

Anônimo disse...

Tati, o importante é não perdermos nunca a essência, pq é onde tudo começa. Podemos fazer ínumeras escolhas, estudar, acreditar, buscar outros caminhos mas olhar pra dentro e encontrar a essência lá firme e forte, é uma dádiva. Qto à filhos nem falo nada, eu tbém gostaria que os meus ficassem sempre debaixo das minhas asas...mas filhos são pássaros...a nós mães, cabe passar os valores que achamos corretos e dar o exemplo. E tenho certeza que seu filho estará bem pq é SEU filho.
Prece de mãe Deus sempre ouve, seja ela da religião que for, pq religiões e crenças foram criadas pelo homem...além do mais, a maior proteção que um filho pode ter é o amor, e ele tem sobra né? Parabéns pra vc tb Tati.
Sábado estaremos no Pantanal!
Beijos!

Anônimo disse...

Vc é maior do que imagina Tatiana. Se ele não acredita é porque ele tem uma Deusa por aí. Um dia ele se apegará nele , talvez até por um motivo parecido que o fez deixar no armário. E ele encontrará.Deus é grande também.
A semente vc já plantou !
Vc é mãe pra qualquer filho se orgulhar !

Anônimo disse...

Vc me consegue fazer rolar de rir e me comover...adoro seus textos.
Meu filho tb é ateu, respeito sua opção...mas acho triste, serio mesmo.Acho reconfortante crer em Deus, a despeito de qq elocubração filosofica...acho reconfortante mesmo.