terça-feira, 13 de dezembro de 2005

A Marvada da Cachaça

Minha casa não é grande então a minha maior preocupação era arranjar lugar pra todo mundo poder se ajeitar.
Fui colocando todos os bancos e cadeiras da casa no quintal.
O baú da sala ( lindo e chiquérrimo) virou mesa de centro. Eu feliz em poder usar aqueles porta-copos. Ninguém deu bola pro meu porta-copos e meu baú chiquérrimo ficou cheio de bolinhas. Moderno até.
Aí mais gente ia chegando. Não tinha jeito, pedi aos dois homens menos grogues da festa que levassem meu sofá ( levanta sofa, bate no batente da porta, eu orientando, pra cima, pro lado, pra baixo) e o colocasse no meio do quintal com minha chiquérrima manta de crochê dando um certo ar do campo. Uma cena maluca. Um monte de gente sentado no quintal, cachorros, gato, criança, cerveja, patês, torradinhas, violão, cajon, pandeiro, caxixis, clarinete e um friozinho que não combinava com dezembro. O que me obrigou a tirar de meu armário todos os meus xales para distribuir para os friorentos.
O som rolando e eu, enlouquecida, catando latinha de cerveja. Não posso ver uma latinha de cerveja vazia que me dá um negócio. Limpa cinzeiro, cata latinha, briga com o cachorro fedorento que rói o pé da moça que eu nunca tinha visto na vida e apareceu sei lá como na festa. Azeitonas pretas servem de diversão para o gato entediado.
Outra moça é alérgica a glutem e mete o dedão dentro do pate de cebola, hummm delícia. Meia hora depois está botando os bofes pra fora.
Todo mundo bêbado e eu sóbria, catando latinha de cerveja, fechando saco de lixo, colocando copo em cima de meu porta-copo, um pobre desprezado.
Esqueceram o portão aberto. Os cachorros sairam correndo atrás de um negão de dois metros que estava puto e querendo matar meus cachorros porque estes queriam provar de sua carne escura e saborosa.. Eu, gloriosa com meu xale rosa choque, correndo atrás dos cachorros, no meio da rua escura berrando pra casa, tila, tila, larga o moço, o negão com uma pedra na mão, eu com uma correia batendo no chão pra assustar o cachorro, o negão leva susto comigo, eu levo susto com o negão, os cachorros correm mais ainda atrás do moço que sai me xingando de alguma coisa que parecia ser vaca de filha de uma puta.
Volto pra casa descabelada e ninguém percebeu que eu tinha evitado uma catástrofe.
Meu vaso de onze horas foi assassinado. Nenhuma pista. O gato lambia sensualmente o patê de atum. O pessoal se animava e a uma da manhã o som ao vivo era alto. A vizinha acende a apaga a luz. Abre e fecha janela. O povo dançando um ciranda. A cachorra lambe o pote de patê de cebola. Deve ser alérgica também porque vomita em cima das minhas onze horas sem vaso. Duas dentistas vestidas de branco dançam. A vizinha deve me achar macumbeira e hoje é dia de festa de santo. Não abre mais a janela. Espero, resignada, a chegada da polícia.
Acaba a cerveja. Uma outra moça cai em meu colo, indignada porque não se cantou um parabéns e coloca 28 pedacinhos de palitinhos salgados em um poote de patê de queijo e puxa o parabéns. Cada um canta no seu tom, do seu jeito. Os cachorros uivam.
A cozinha ficou pequena pra tanta gente. Meu xalé enrosca na maçaneta da porta e eu sou quase degolada. Niguém percebe. Minha vontade de pegar um vassoura e varrer a cozinha é quase incontrolável. Meio copo de cachaça Germânia cai no chão. Um pisa e pegadas alcóolicas marcam meu chão. Um monte de gente abraça o aniversariante que chora.
Alguns começam a ir embora. Alguns não deviam ir embora porque são perigosos quando bêbados. Me sinto a tia velha. Surgem do nada milhares de latinhas e eu, de quatro, de baixo da mesa da cozinha encontro um maço de cigarro esquecido. Dez pessoas fumam os últimos dois cigarros.
A moça do glutem tá meio verde. Faço uma caminha improvisada com direito a balde, guardanapo e um gato esquentando os pés frios.
A vassoura de cabeça para baixo atrás da porta é tiro e queda.
Acaba a festa.
Um camburão passa lentamente e eu olho par dois policiais enquanto varro feliz da vida, a minha cozinha. Dou um tchauzinho amistoso e vou dormir.

5 comentários:

Anônimo disse...

Hahaha.. que ótimo este texto Tati. Eu também sou cheia de dar milhares de festas em casa e ficar dando rondas recolhendo latinhas e tirando os copos dos móveis. E isso vem da minha mãe, que com 3 filhos roqueiros, 2 cachorros e um quintal imenso, é figurinha conhecida da ronda noturna que sempre passa para mandar abaixar o som.

Anônimo disse...

E eu perdi essa festa! Maravilha!

Tatiana disse...

to podre, meus maigos, podre!

Anônimo disse...

That's what I call fun, lady!!!

Muito boa a sua festa...

Quando for a Campinas, sou penetra de honra, viu?

Anônimo disse...

Menina, isso é que é festa. Meus parabéns. Que bom, depois de 21 dias trabalhando sem parar, ler algo que bate junto com essa chuva forte de quase verão...
Ronaldo Faria