Dormi em lençóis limpos e cheirando a lavanda, erva que eu tanto adoro.
Todos os meus músculos agradeciam o descanso merecido, meu corpo era capaz suspirar de satisfação.
As tarefas cotidianas em ordem, minha casa em ordem é minha vida interna em ordem. Sempre foi assim. E fui até tarde para colocar tanta coisa em seu devido lugar.
Paulinho da Viola foi meu companheiro e cantou para mim enquanto a noite começava.
Dormi feliz e cansada e sonhei a noite toda.
Eu estava em uma casa antiga e muito estranha. Parecia uma pensão e eu estava recebendo uma mulher. Mas alguma coisa no lugar me incomodava bastante. Uma sensação de fora de ordem. Pessoas muito estranhas passavam por ali.
A dona da pensão sempre me acompanhando e me explicando as coisas da casa.
Voce tem que cuidar das almas, ela me disse.
Olho para ela e pergunto:
-Da alma dos vivos ou dos mortos?
- Da que for possível.
- E a tua alma? É de vivo ou é de morto?
- De morto.

Sim. Todas aquelas pessoas ali eram mortos que vagavam por aquela casa e eu tinha, de alguma forma, que cuidar delas. Como, não sei.

Acordei com esta mensagem na cabeça. Tenho que cuidar das almas.

Ontem durante a arrumação coloquei, junto do lugar que eu guardo o omitama, colchas e mantas.
O omitama me permite fazer o okiome, tipo de passe japonês, uma transmissão de energia divina. Ele é tratado com reverência, cheio de cuidados e rituais.
Eu sou uma kumitê muito da esculhambada e rebelde. Não aceito tantas regras, tenho dificuldade para assimilar alguns dogmas e estou afastada.
Okiome serve para iluminar as almas dos mortos, a verdade é essa.
No dia que eu mexo no lugar que guardo meu omitama, sonho isso.
É de ficar atenta, não é??