Conversa durante o almoço lá em casa.

- Mas quem era aquele cara? - pergunto eu para os meninos de nove, onze e doze anos.
- Era meu ex-pai - responde o menorzinho.
-Como assim, ex-pai. Pai é pai e ponto final. Não existe ex-pai. - eu, cheia das convicções.
-Existe sim. Pai mesmo era o pai que me criou e que morreu de enfarte. Agora eu voltei a morar com minha mãe, só porque ele morreu. Esse aí eu não gosto. Ele é meu ex-pai.
- E você mora com sua mãe?
-Moro com ela e com os meus dois irmãos mais novos que nasceram de seis meses.
- E ela casou outra vez?
-Não, mas namora com o pai dos meus irmãos. E quando eles brigam eu digo para eles assim: tomem vergonha na cara porque vocês tem dois filhos parea criar! Mas as brigas nunca duram muito tempo.
O de doze anos emenda:
-Eu tenho um ex-pai também. Meu pai que me fez nunca cuidou de mim, nem leite dava. Eu não tenho mais pai. Tenho ex-pai.

Eu ali, de queixo caído, ouvindo dois meninos falarem de forma tão definitiva sobre suas relações com os respectivos pais.
E eu fiquei a pensar. Caramba, já se tem ex-pai! Eu não sabia disso!
Caramba, um molequinho de nove anos sabe reconhecer que algumas coisas não valem à pena brigar. O que vale à pena é criar essas crianças.
Outro garoto abandonado do seu direto a paternidade.
Essas coisas que me matam.
Assim, no meio da minha cozinha, durante um almoço comum.
Ex-pai.
Nunca vi isso.
To bege.